24/08/2020
João Maria Lós, presidente do TRE:
As eleições deste ano serão diferentes, por vários motivos, sendo que o principal deles é a Pandemia de Covid-19. Regras de distanciamento físico, e outras medidas para evitar o contágio, como a proibição da identificação por biometria, serão implantadas. Outras mudanças já estavam previstas até mesmo antes da disseminação do coronavírus, como por exemplo a proibição de coligações entre os vereadores.
O presidente do Tribunal Regional Eleitoral, João Maria Lós, diz que ao Correio do Estado que está atento ao avanço da pandemia e que mais medidas, como a obrigatoriedade do uso de máscara durante as votações, poderão vir a serem tomadas futuramente.
“O Congresso Nacional e a Justiça Eleitoral vem tomando providências para que as eleições ocorram com segurança sanitária”, afirma.
Com a pandemia a Justiça precisou fazer alguns ajustes tecnológicos para continuar funcionando. No TRE-MS o que foi alterado e o que deve ser mantido pós-pandemia?
O atendimento ao eleitor é comumente feito presencialmente no cartório eleitoral, mas a pandemia da Covid-19 obrigou a Justiça Eleitoral a oferecer um serviço de atendimento on-line (denominado sistema Título Net, implantado em 23 de abril deste ano), para permitir alistamento, transferência de domicílio eleitoral, revisão ou regularização da inscrição eleitoral até o prazo do fechamento do cadastro eleitoral. Com essa inédita prestação de serviços na modalidade totalmente digital, o TRE-MS atendeu mais de 11 mil eleitores, em menos de duas semanas, assegurando o direito de voto na eleição municipal de 2020.
Além do que, as sessões plenárias do Tribunal passaram a ser realizadas por videoconferência e houve também a permissão para a realização das convenções partidárias de forma virtual. E, embora não decorra de uma ação preventiva à pandemia, um outro ponto importante foi a implantação do Processo Judicial Eletrônico (PJE) em todos os cartórios eleitorais do Brasil, o que proporcionará maior celeridade na tramitação processual dos pedidos de registro das candidaturas, das pesquisas eleitorais, de direito de resposta, das representações eleitorais e das prestações de contas de campanha. À exceção das convenções, cuja avaliação caberá aos partidos políticos, acredito que o sistema Título Net, as sessões virtuais e o PJE possam ser mantidos pela Justiça Eleitoral pós-pandemia.
A legislação eleitoral precisou se adequar para que as eleições ocorressem com segurança. Como o senhor avalia a suspensão da biometria na votação?
O TSE instituiu uma Consultoria Sanitária para a Segurança do Processo Eleitoral de 2020, integrada por infectologistas da Fundação Fiocruz e dos Hospitais Sírio-Libanês e Albert Einstein, que recomendou a exclusão da identificação do eleitor mediante biometria, visando diminuir os riscos de formação de filas e de infecção, durante a votação. Mas a identificação dar-se-á mediante a apresentação do e-Título (título eleitoral eletrônico) ou de um dos seguintes documentos (carteira de identidade, identidade social, passaporte, carteira de categoria profissional reconhecida por lei, certificado de reservista, carteira de trabalho ou carteira nacional de habilitação).
A suspensão da biometria deu-se por uma necessidade sanitária, como medida voltada para proporcionar a maior segurança possível para os eleitores, mesários, fiscais partidários e demais colaboradores, durante todo o horário de votação. Considero acertada essa decisão porquanto assegura o exercício do sufrágio com menor risco à saúde e à vida.
As reuniões políticas não estão suspensas, cada município tem uma legislação sobre aglomeração e demais atitudes que podem alimentar o contágio da Covid-19. Como a Justiça Eleitoral tem trabalhado com as prefeituras para que tudo seja cumprido? O TRE está acompanhando os decretos municipais?
Nas eleições municipais o processo eleitoral ocorre originariamente nas Zonas Eleitorais, presididas por juízes eleitorais, cabendo ao TRE a função de coordenar a organização do pleito e de julgar os recursos impetrados contra as decisões proferidas pelos juízes eleitorais. Assim, em relação à propaganda eleitoral, cabe ao juiz eleitoral acompanhar a situação nos municípios que integram a sua jurisdição e eventualmente decidir sobre. Contudo, é importante lembrar que a Emenda Constitucional expressamente determina que os atos de propaganda eleitoral não poderão ser limitados pela legislação municipal ou pela Justiça Eleitoral, salvo se a decisão estiver fundamentada em prévio parecer técnico emitido por autoridade sanitária estadual ou nacional.
No fim do mês começam as convenções partidárias, que podem ser feitas pela internet. O senhor acha que o processo democrático ficou prejudicado já que em locais do nosso estado não têm acesso à internet?
Não fica prejudicado porque a Resolução TSE nº 23.623/2020, que possibilita a realização por meio virtual da convenção partidária para deliberação sobre a formação de coligação e escolha dos candidatos, não proíbe a sua realização de forma presencial, apenas exige que, caso o partido opte por fazê-la presencialmente, deverá observar as leis e as regras sanitárias. Ademais, acredito que todos os municípios do nosso Estado já têm acesso à internet.
Com relação ao uso de templos religiosos para a realização de reuniões entre candidatos e fiéis, o chamado abuso de poder religioso. Como o senhor acha que pode ser enquadrada na lei essa “modalidade”?
No dia 18 de agosto deste ano, o TSE concluiu o julgamento do Recurso Especial Eleitoral nº 82-85.2016.6.09.0139 em que se discutiu uma proposta do relator do processo, de fixação de tese para as eleições 2020 e seguintes, da possibilidade do exame jurídico do abuso de poder de autoridade religiosa em sede de ações de investigação judicial eleitoral (AIJE), tendo sido rejeitada a proposta por maioria. O tema é polêmico, mas compartilho do entendimento que a legislação atual não prevê a possibilidade de processamento de uma AIJE por abuso de poder de autoridade religiosa autonomamente. Ademais, já existem meios processuais disponíveis para combater eventual conduta religiosa ilícita, podendo, a depender de cada caso concreto, ser processada em sede de abuso de poder econômico (LC nº 64/90, arts. 19 e 22), de proibição de doação oriunda de entidades religiosas (Lei nº 9.504/97, arts. 24, VIII, e 30-A), de representação por veiculação de propaganda eleitoral em templos (Lei nº 9.504/97, art. 37, § 4º), ou de representação por captação ilícita de sufrágio (Lei nº 9.504/97, art. 41-A).
Qual a expectativa do senhor como presidente do TRE-MS para este pleito?
Sem dúvida teremos uma eleição diferente de todas as outras já realizadas, em razão da proibição de coligação partidária para a eleição proporcional (cargo de vereador), da utilização do processo judicial eletrônico (PJE) em todas as instâncias da Justiça Eleitoral e, preponderantemente, em razão da pandemia da Covid-19, mas a expectativa é de que até a data das eleições as condições sanitárias já estejam em níveis bem aceitáveis. Hoje a Justiça Eleitoral está realizando as atividades administrativas preparatórias para a realização do pleito, como agregação de seções, convocação de mesários, formação das juntas eleitorais, definição dos pontos de transmissão dos resultados, requisição dos locais de votação, contratação de serviços e materiais a serem usados no dia do pleito, treinamento e capacitação das pessoas envolvidas, bem como adotando as providências relacionadas à parte jurisdicional. E ainda, definindo todos os protocolos sanitários a serem adotados, de modo que o pleito ocorra com segurança para os eleitores, mesários, fiscais partidários, servidores, candidatos, juízes, promotores, forças policiais e demais colaboradores.
O senhor acredita que, em razão da pandemia e da vedação de se coligar as chapas proporcionais, deve diminuir o número de partidos nas câmaras municipais?
Na minha compreensão o fator pandemia dificulta sobremaneira expedir um prognóstico, porém registro que tanto o Congresso Nacional como a Justiça Eleitoral vêm adotando as medidas necessárias para que as eleições ocorram com segurança sanitária. Em relação à proibição de coligação no pleito proporcional, penso que a medida possibilita um aumento do número de candidatos, entretanto, quanto ao número de partidos com representação nas câmaras de vereadores, dependerá essencialmente da escolha livre e soberana do eleitor, a partir dos nomes submetidos ao sufrágio.
A Justiça Eleitoral dará equipamentos de proteção individual para os mesários? O que será disponibilizado além de álcool?
O Ministro Luís Roberto Barroso, Presidente do TSE, conclamou especialistas, instituições e empresas a colaborarem com a Justiça Eleitoral no enfrentamento da pandemia da Covid-19, mediante assessoria especializada e também doações de materiais e serviços, visando a realização das eleições com a maior segurança possível. Cito duas ações em andamento no TSE sobre isso:
1) a Consultoria Sanitária para a Segurança do Processo Eleitoral de 2020 está elaborando uma cartilha de recomendação sanitária para o dia da eleição, onde devem levar em conta cuidados para eleitores, mesários, fiscais de partido, higienização do espaço físico das seções, policiais, agentes de segurança e servidores da Justiça Eleitoral; e 2) o edital para doação de equipamentos de proteção individual, que vencerá no dia 24.8.2020, em que o TSE solicita máscaras cirúrgicas descartáveis, frascos de álcool etílico em gel 70%, protetores faciais, frascos de álcool etílico desinfetante 70%, rolos de papel toalha e rolos de fita adesiva para marcação de distanciamento social, serviço de logística e de transporte. A intenção é disponibilizar todos os materiais solicitados para os envolvidos no processo de votação nas seções eleitorais, mas a definição só ocorrerá com a conclusão do procedimento de doação.
O eleitor que estiver sem máscara será barrado na seção eleitoral pela Justiça Eleitoral por conta da pandemia da Covid-19?
Essa é uma decisão que será tomada mais pra frente pela Justiça Eleitoral, após ouvir a já mencionada Consultoria Sanitária para a Segurança do Processo Eleitoral de 2020, sem descurar que, tratando-se de um País de dimensões continentais, serão levadas em conta as diferentes realidades pandêmicas nos 5.569 municípios brasileiros. No entanto, o certo é que avaliaremos todos os riscos à saúde pública durante a votação, que divulgaremos oportunamente os procedimentos e protocolos sanitários e ambientais a serem adotados e que, buscaremos, com o apoio dos eleitores, dos candidatos, dos partidos políticos, da sociedade civil, das instituições públicas e privadas, das forças de segurança e da imprensa, garantir o direito de voto, de forma livre e com segurança, em benefício da democracia do nosso Brasil.
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