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Entrevistas |
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23/07/2009
Trabalhadores da Brenco são flagrados em alojamentos precários
Em operação que começou em 26 de fevereiro e continua em curso, o grupo móvel de fiscalização do governo federal flagrou até o momento 133 trabalhadores alojados em condições degradantes nos empreendimentos da Brenco nas cidades goianas de Campo Alegre de Goiás e Mineiros.
Comandada pelo ex-presidente da Petrobras, Henri Phillipe Reischtul, a Brenco (Brazil Renewable Energy Company; Companhia Brasileira de Energia Renovável, em Português) tem, entre os investidores, o ex-presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton; James Wolfensohn, ex-presidente do Banco Mundial; Steve Case, ex-America On Line (AOL)-Time Warner; e Vinod Khosla, multimilionário indiano radicado nos Estados Unidos que criou a Sun Microsystems.
A Brenco está cultivando a sua primeira safra. Criada em 2007, tem cinco usinas com capacidade de produção de 3,8 bilhões de litros de etanol/ano, que ainda não estão finalizadas. Está prevista a construção de outras cinco - todas na região de fronteira entre os estados Goiás, Matos Grosso e Mato Grosso do Sul. A empresa anuncia em seu site que será uma das maiores do mundo no ramo até 2015.
Em Mineiros, a equipe fiscalizatória encontrou 116 trabalhadores alojados em duas hospedarias e três casas. Todos os locais estavam superlotados e em péssimas condições, segundo a auditora fiscal do trabalho Jacqueline Carrijo, coordenadora da ação. As pessoas estavam trabalhando em duas usinas da Brenco no município. Em nenhuma das casas a instalação sanitária estava adequada. Numa das casas, 15 pessoas dormiam num mesmo quarto. Em outra, a chuva havia molhado todos os colchões.
Todos os contratos dos alojados em Mineiros serão rescindidos. "O ´gato´ (contratador de mão-de-obra a serviço da empresa) havia prometido alojamento na cidade de Mineiros. Mas, diante da comida e das condições ruins, perderam a confiança na empresa", explica Jacqueline.
Em Campo Alegre de Goiás, havia 17 pessoas contratadas pela empresa desde janeiro alojadas de modo irregular, aguardando autorização para serem transportadas para Alto Taquari (MT). De acordo com a equipe fiscalizatória, os trabalhadores ainda eram obrigados a pagar aluguel ao "gato". "O alojamento era sujo e havia ratos e baratas. O chuveiro estava quebrado com risco de choque e os quartos não tinham armário. Tudo estava pelo chão: lixo, roupas e pertences", descreve a coordenadora da ação. Ela completa que um dos quartos, com 11 metros quadrados, era dividido por sete trabalhadores.
Os 17 trabalhadores já receberam suas verbas rescisórias e voltaram para casa. Em nota sobre o caso, a Brenco atribui o fato à falha no "esforço logístico de transporte e acomodação dos trabalhadores" e lamenta o ocorrido.
Até agora, a equipe do grupo móvel já passou pelas usinas em Alto Taquari (MT), em Perolândia (GO) e nas duas usinas em Mineiros (GO) e visitou alojamentos no campo e na cidade. Pretende ainda fiscalizar as condições de trabalho e alojamento na usina Costa Rica (MS).
Os 17 trabalhadores de Campo Alegre de Goiás vieram do Nordeste e foram aliciados em Resfriado (GO). Conhecido como João Paracatu, o preposto da Brenco ofereceu trabalho, carteira assinada, seguro de saúde e alojamento na cidade. Os trabalhadores foram contratados para a empreitada na cana e levados até Campo Alegre de Goiás. "Mesmo sendo funcionário da empresa, o contratador da empresa manteve a prática antiga de aliciamento com base na promessa enganosa", lamenta Jacqueline Carrijo.
Alguns trabalhadores estavam com problemas para receber devido à falta de documentos e passavam fome. Eles sofriam ameaças do contratador por não pagarem o aluguel. De acordo com o relato dos trabalhadores, reclamações foram encaminhadas à empresa, mas não houve providências.
Isolamento Além dos problemas das hospedagens urbanas, havia irregularidades nos alojamentos Netinho 1 e Netinho 2, em Alto Taquari, que abrigam juntos cerca de 1,5 mil pessoas. Segundo os fiscais, o local estava isolado e a construção não estava finalizada: faltava ambulatório médico, refeitório, lavanderia e outros alojamentos. "Não há transporte regular ou possibilidade de comunicação. Os trabalhadores estavam desesperados para falar com suas famílias", explica a coordenadora da ação. "A proposta das instalações no papel é ótima. Nunca vi um alojamento tão bom... Mas está inacabado."
Nesta quinta-feira (6), ao voltar ao local depois de 15 dias, a equipe decidiu interditar o Netinho 1 por considerar que não havia condição nenhuma de alojar trabalhadores: a chuva havia danificado todo o sistema hidráulico e sanitário, que havia sido construído recentemente. Parte do alojamento Netinho 2 já estava interditado porque havia instalações sanitárias danificadas.
O procurador do trabalho Antônio Carlos Cavalcante, que integrou o grupo móvel, sublinha que, além do isolamento e da incomunicabilidade, outro agravante no caso em questão da Brenco diz respeito à falta de atendimento médico. "Fizemos algumas exigências iniciais, principalmente na área de saúde. É necessário que haja pelo menos uma ambulância e um médico. A empresa diz que já comprou a ambulância, mas ela não está lá".
Para a equipe, medidas relativamente simples bastariam para corrigir os problemas encontrados. Nenhum contrato foi rescindido. No entanto, muitos trabalhadores estão descontentes e querem sair da fazenda. Nestes casos, serão feitas rescisões indiretas de contrato.
Em comunicado à imprensa sobre a ação, a Brenco diz que não houve interdição dos alojamentos. Garante, ainda, que os problemas já foram sanados e que as instalações se encontram em perfeitas condições.
Plantação O grupo móvel também visitou as frentes de trabalho da empresa, onde os contratados pela Brenco fazem o plantio de cana-de-açúcar até maio. Nas fazendas Laranjeiras e Quixadá I, propriedades arrendadas para abastecer as usinas de Mineiros, o transporte de mudas de cana foi interditado. De acordo com a médica do trabalho e integrante do grupo móvel, Maria Cristina Toniato, falta aos veículos um cinto de segurança especial que deve ser usado por trabalhadores que jogam as mudas do alto dos caminhões canavieiros. A empresa informou a equipe que já havia providenciado a compra do equipamento e o problema deve ser resolvido na próxima semana.
Na sua nota, no entanto, a Brenco diz "estranhar" a interdição e argumenta possuir "clara orientação" sobre a necessidade do uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs). "Nossos fiscais estão orientados claramente a não permitir que os funcionários trabalhem sem a utilização de EPIs. Não há autorização para qualquer trabalho em condições inseguras. A empresa está apurando se houve alguma irregularidade, para providências internas", completa. Segundo a Brenco, as atividades continuam normalmente.
O procurador do trabalho Antônio Carlos não pretende firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Brenco. Ele pretende ajuizar uma ação civil pública diretamente na Justiça do Trabalho. "A empresa não tem postura de negociação. Para que vou fazer um TAC que será descumprido?", indaga. Ele ainda não sabe quanto vai pedir de indenização por danos morais coletivos, mas calcula que, inicialmente, o valor será de R$ 5 milhões.
Nota da Brenco à imprensa Comunicado da Brenco sobre os 17 trabalhadores
Matéria modificada em 23 de maio de 2009.
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