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Geral
14/11/2008 - 08:42
Desemprego destrói auto-estima e pode até levar à depressão
Foto: Divulgação
Midiamaxnews
Os fracassos na tentativa de retornar ao mercado de trabalho fazem com que o desempregado encontre em si mesmo o culpado por sua situação de desemprego. A auto-culpabilidade, associada a um estranhamento da realidade, desponta-se entre os efeitos emocionais do desemprego conforme mostra a pesquisa “Implicações Psicossociais do Desemprego para a Consciência Individual – Manifestação no Pensamento e Emoção”, coordenada pela psicóloga Inara Barbosa Leão, professora na UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul).

“A pessoa tende a achar que a culpa é dela”, afirma a psicóloga com base em entrevistas com mil desempregados de Campo Grande. Segundo a professora, essa sensação ocorre em meio a um estranhamento, isto é, dificuldade de entender o porquê das mudanças. “A pessoa não consegue compreender o que está dando errado. Tudo que disseram que ela precisava fazer, ela fez, mas não deu certo. Disseram que era importante estudar, qualificar-se, ter boa aparência. A pessoa fez tudo isso, mas está desempregada”, explica a professora. A psicóloga salienta que esse sentimento tende a ser maior entre pessoas com escolaridades mais avançadas.

Como fez tudo o que era socialmente recomendável e continua sem trabalho, o desempregado passa a encontrar no espelho o vilão dos acontecimentos de sua vida. “A pessoa pensa que não consegue emprego, porque não se esforça o suficiente, que não levanta tão cedo para ir à agência”, ilustra Inara.

O depósito da culpa em si mesmo é estimulado pela mudança de comportamento das outras pessoas. “Os colegas, os amigos, as pessoas dos diferentes grupos sociais tendem a se afastar de quem fica desempregado”, analisa a psicóloga. Ela explica que, em razão da equivalência social entre o que a pessoa faz e o que ela é, o desempregado é socialmente anulado, pois deixou de exercer uma profissão. “A perda do emprego representa a perda da identidade social”.

Antigo lar

A família se torna o refúgio. Conforme Inara, uma das conclusões do estudo é de que a família exerce função significativa na vida do desempregado. “Quem mais ajuda o desempregado não são as políticas públicas, mas suas famílias. Essa ajuda é tanto emocional quanto material”, diz. A professora afirma que o estudo mostrou que muitas pessoas retornam para a casa dos pais quando ficam desempregadas. O retorno para a casa dos pais é, por vezes, desencadeado por outros acontecimentos – a seqüência comum é desemprego, brigas, separação, procura pelos pais.

A volta para a casa dos pais significa também a volta à infância. “Socialmente, ser adulto está ligado à capacidade de se sustentar sozinho. Então, quando a pessoa sem emprego retorna para a casa dos pais, ela volta à condição de criança. Os pais colocam horário para ela chegar em casa, falam para evitar más companhias, por exemplo”, ilustra a professora.

Se, por um lado, as pessoas próximas são as que mais ajudam, por outro, são as que mais cobram. Inara observa que a família também sofre as conseqüências da inserção de uma ou mais pessoas na casa – há um impacto no orçamento. Esse impacto suscita uma mudança de comportamento de quem antes apenas se preocupava em apenas ajudar. “Um entrevistado falou assim: 'o modo das pessoas olharem para a gente mudou'”, lembra Inara. A acusação por vezes é explícita. “Alguns acusam claramente”, diz a professora, salientando que, conforme mostrou o estudo, um nome comum dirigido aos desempregados é “vagabundo”.

Filhos

Os efeitos emocionais em desempregados com filhos tendem a ser mais críticos. Inara observou na pesquisa que os filhos se despontam como elemento de maior preocupação dos desempregados. Quando se trata da dificuldade de suprir as necessidades materiais, pais e mães sem emprego lembram, primeiramente, dos filhos. “Muitos disseram assim: 'Eu já não sei mais o que falo para meus filhos. Eles pedem coisas e eu não tenho dinheiro para comprar'”, cita a psicóloga. De acordo com Inara, a solução não está em simplesmente tentar explicar o que está se passando para a criança, pois ela não tem a mesma capacidade de compreensão de um adulto.

A situação emocional do desempregado, que tem filho, pode se agravar quando há o retorno para o antigo lar. Os avós tendem a tratar os netos como se fossem seus filhos. “Meus pais tomaram os meus filhos”, foi um tipo de frase recorrente nas entrevistas, de acordo com a professora. A perda dos filhos ocorre em meio a outras perdas: a do trabalho, a dos grupos sociais e, por vezes, a do cônjuge.

Em se tratando de filhos pré-adolescentes e adolescentes, a situação gerada pelo desemprego pode destruir a confiança no pai, que vê minguar seu papel na relação. “Há casos em que os filhos dizem: 'Você não manda em mim, você não me sustenta, você não faz nada'”, conta Inara.

Doenças e esperança

Essas transformações nas relações da pessoa desempregada reduzem a esperança a nível muito baixo – embora não chegue a eliminá-la por completo –, salienta a pesquisadora. As pessoas começam a achar que nada mais vai dar certo. “A longo prazo, essa situação pode resultar em doenças psicossomáticas”, afirma.

Mas essa situação não é freqüente, em razão de o período médio de desemprego no Brasil ser relativamente curto. “O tempo de desempregado no Brasil varia, em média, de três meses a um ano. Isso é pouco na comparação com outros países”, afirma Inara. “A maioria dos desempregados acredita que vai arranjar outro emprego”, diz a professora em menção à atenuante dos pesados efeitos emocionais: a persistência da esperança.

A pesquisa “Implicações Psicossociais do Desemprego para a Consciência Individual – Manifestação no Pensamento e Emoção” será transformada em livro, distribuído em dois volumes. O primeiro deve ser lançado no início do próximo ano, segundo estima a professora Inara. A segunda parte do estudo, referente às análises qualitativas, será concluída em meados de 2009 e deve ser publicada em forma de livro nesse mesmo ano.
    
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