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Geral |
19/07/2013 - 20:19 |
Ex-diretor do HU teria favorecido colegas em concurso, diz polícia |
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Foto: Divulgação |
G1_MS |
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José Carlos Dorsa A Operação Sangue Frio, da Polícia Federal, que começou investigando denúncias de irregularidades no atendimento a pacientes de câncer, revelou indícios de vários crimes atribuídos a gestores da saúde pública em Campo Grande. O inquérito já dura um ano e ainda não foi concluído. Um dos relatórios cita um concurso público realizado em 2012 pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). A polícia suspeita que alguns candidatos aprovados receberam favorecimento.
Escutas telefônicas mostram o ex-diretor do Hospital Universitário, José Carlos Dorsa, quando ainda estava no cargo, preocupado em checar a lista dos convocados para não ser surpreendido
Dorsa: Vou passar aqui nessa GRH (Gerência de Recursos Humanos) para checar quais os nomes que foram mandados convocar, viu?
Alcides: É tudo transferência?
Dorsa: Não. Convocação do concurso. Já foi hoje para a reitoria, mas foram seis nomes. Eu vou passar para ver quais foram, para ver se não estão ludibriando a gente. Tá?
Alcides: Lógico!
O concurso público visava a contratação de médicos para o HU. O que chamou a atenção da Polícia Federal foi o grau de relacionamento entre Dorsa e os aprovados para as vagas de médicos.
O edital assinado pela reitora Célia Maria Oliveira, que homologou o resultado do concurso, trouxe como aprovados os médicos Amanda Ferreira Carli Benfatti, Jandir Ferreira Gomes Júnior e Ronaldo Perches Queiroz, todos do quadro da Cardiomed, clínica que pertence a José Carlos Dorsa.
Os outros dois médicos aprovados no concurso foram Paulo Henrique Silva Mariano, que prestava serviços no Hospital de Câncer, e Thiago Franchi Nunes, filho da então diretora da Secretaria de Saúde de Campo Grande, Maria Anizia Franchi, uma das investigadas da Operação Sangue Frio.
Em agosto de 2012, Thiago recebeu a notícia de que estava sendo convocado para o cargo em um telefonema do então diretor do HU.
Dorsa: Eu estou te ligando pra te dar uma notícia.
Thiago: Ah, é?
Dorsa: Saiu a sua nomeação, tá?
Thiago: Ah, que maravilha!
Dorsa: Você precisa ir lá no GRH (Gestão de Recursos Humanos), em frente daquelas pró-reitorias. né?
Thiago: Uhum. Amanhã eu vou lá.
Os outros aprovados foram comunicados em uma reunião convocada por Dorsa e o assessor dele, Alcides Nascimento.
Dorsa: Adivinha o que é que eu estou levando? Inclusive você convoca o bolão (Ronaldo Queiroz) e todo mundo.
Alcides: O que será, hein?
Dorsa: A nomeação deles!
Alcides: Alas!
Dorsa: Estou levando a nomeação para assumirem de imediato. Amanhã, assumir o cargo!
Alcides: Que beleza! Que ótimo!
Dorsa: Amanda, Jandir, Bolão, Paulo Henrique. Estão todos nomeados. Estou levando em mãos. Eles vão pagar alguma coisa pra nós, hoje? Algum negócio?
Alcides: O Bolão vai ter que pagar duas! E já vamos mandar a mensagem para todo mundo.
No Diário Oficial da União, as nomeações foram publicadas dois dias após esses telefonemas.
Todos os cinco médicos foram contratados para cumprir 20 horas semanais no Hospital Universitário, mas de acordo com os dados do Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES), apenas Thiago cumpre o contrato. Ele apresentou documentos sobre a aprovação dele também em outros concursos públicos.
Ronaldo Perches Queiroz, médico pneumologista, não atualiza o CNES desde 2009. Aos membros da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Saúde na Assembleia Legislativa, ele falou sobre o trabalho no HU que assumiu há quase um ano, enquanto ainda era diretor-geral do Hospital Regional (HR). À reportagem, o médico e ex-diretor do HR, disse por telefone que não gravaria entrevista.
Os outros dois médicos da Cardiomed, contratados pelo HU, Amanda e Jandir, foram procurados pela reportagem. O assessor Alcides Nascimento, que também é investigado pela Polícia Federal, se negou a avisá-los da presença da equipe de reportagem na clínica. "Eu não vou chamá-los. se você quiser aguardar, fique à vontade”, disse. Ele também demonstrou-se irritado com a situação.
O ex-diretor do HU, José Carlos Dorsa, negou qualquer irregularidade no concurso. Ele aceitou gravar entrevista no dia em que prestou depoimento à CPI da Saúde, há 11 dias, mas acabou interrompendo a gravação. “A Universidade é quem faz o concurso e eu não tenho dúvida da lisura de todos os concursos. Se alguma investigação tiver de ser feita, que seja feita, está aberta para investigação de qualquer situação dessa natureza. Eu não tenho funcionário nenhum, arguição sua que você quiser”, disse Dorsa antes de tenta arrancar o microfone do repórter.
Em 2012, Dorsa fez um desabafo ao telefone reclamando de ter ajudado alguns médicos da equipe dele.
Dorsa: Fazer só para mim e deixar o resto tudo morrer de fome. Assim que o (fulano) fez a vida dele. Não arrumou nada a vida de ninguém e ninguém tem nada. Eu, fazendo o contrário, arrumo concurso para todo mundo. Todo mundo ganhando 15 mil aqui, 20 ali, 30 aqui, 30 lá, e eu não estou tendo tempo de organizar a coisa que é o serviço.
Além de cuidar de perto do concurso que contrata funcionários para o hospital, a influência de José Carlos Dorsa no campus da UFMS em Campo Grande ia além do HU. As investigações da Operação Sangue Frio revelaram que o então diretor do hospital teve participação ativa na campanha de Célia Maria Oliveira para a reeleição dela no cargo de reitora da universidade. Em um telefonema interceptado pela Polícia Federal em junho de 2012, Dorsa revelou que esse processo eleitoral tinha carta marcada.
Dorsa: Essa eleição, lá no HU, esse pessoal, a ralé, você vai ver, se ganhar, vai ganhar apertado, viu!
Homem: É mesmo?
Dorsa: Você acredita?
Homem: Aí o negócio (candidatos) vai lá para brasília e lá é que escolhe, né?
Dorsa: É, Brasília já está escolhido, né? Brasília já está tudo acertado. Não tem estresse.
Homem: Então, pode ficar até em terceiro, né?
Dorsa: Não, mas não pode. Tem que ficar em primeiro. Porque agora a política é essa, tem que ficar em primeiro. Mas lá em Brasília já tá tudo certo, não tem “pobrema” (sic).
À época, funcionários do HU que não concordavam com a administração de Dorsa travavam uma briga judicial com o diretor e sofriam retaliações. É o que ficou claro em um trecho de escuta telefônica autorizada pela Justiça. A mudança no quadro de funcionários teria o aval da reitora da UFMS.
Homem: Não tem como expulsar esse povo?
Dorsa: Tem como eu fazer muita coisa. Você vai ver o que que eu vou fazer. Eu vou transferir todo, tirar esse pessoal do pronto-socorro, mandar para setores que não fazem 30 horas, que fazem 8 horas, sabe.
Homem: Uhum.
Dorsa: Por necessidade de serviço, né?
Homem: Uhum.
Dorsa: Inclusive essa enfermeira, por num lugar onde não faz 30 horas, vai ter que fazer 8 horas e que não faz plantão. Não é bacana?
Homem: E eles não podem fazer plantão fora do setor deles?
Dorsa: Não. Não pode.
Ao depor à CPI da Saúde da Câmara Municipal de Campo Grande, Célia Maria Oliveira fez questão de deixar claro o que cabe a ela na gestão de pessoal. "O diretor do hospital pode contratos serviços terceirizados. A minha responsabilidade é sobre o pessoal de carreira. Só eu que posso ceder, demitir e enfim, transferir, de acordo com a legislação", disse Célia.
A reitora negou irregularidades no concurso para médicos. “É impossível nos nossos concursos uma, vamos dizer, ajuda, apoio a candidatos que, de conhecidos, de parentes e de tudo mais. Não há denúncia ou qualquer dúvida que coloque esse concurso sob suspeição”, declarou.
A ex-diretora da Secretaria de Saúde de Campo Grande, Maria Anizia Franchi, disse desconhecer que está sendo investigada na Operação Sangue Frio. Ela também enfatizou que, em nenhum momento, intercedeu pela aprovação do filho, Thiago Franchi Nunes, no concurso do Hospital Universitário.
O médico Paulo Henrique Mariano, que também foi nomeado para uma das vagas no HU, foi procurado pela reportagem. A secretária informou que ele não poderia atender porque estava no centro cirúrgico. Depois, ele não retornou os contatos. |
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