Em reunião na manhã desta segunda-feira (25), o secretário estadual de Segurança Pública de Mato Grosso do Sul, Carlos Videira, confirmou publicamente que o ex-prefeito de Campo Grande e pré-candidato a governador, Marquinhos Trad (PSD), é investigado por 'crimes contra a dignidade sexual'.
A Polícia Civil de Mato Grosso do Sul instaurou inquérito policial para apurar os casos no último dia 5 de julho, mas a ocorrência é de 2020.
Procurado pela reportagem, Marquinhos Trad alega que tudo faria parte de uma 'armação política daqueles que não querem largar o poder' para prejudicar a candidatura dele a menos de 3 meses das eleições.
No entanto, confrontado com detalhes dos relatos de uma das mulheres, que relatou um caso extraconjugal e diz ter feito sexo consensual com o então prefeito, Marquinhos Trad admitiu ao Jornal Midiamax que cometeu adultério enquanto estava na Prefeitura de Campo Grande.
"Eu errei, mas não cometi crime algum. Devo a Deus, à minha esposa e às minhas filhas. Eu reuni toda minha família e confessei”, disse o pré-candidato a governador de Mato Grosso do Sul. Segundo ele, após confessar a traição, foi perdoado pela esposa e pelas filhas.
Além da mulher com quem Marquinhos Trad confessou ter tido um relacionamento fora do casamento, mais três procuraram a polícia e figuram como vítimas.
O inquérito policial trata dos crimes de estupro, favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual, assédio sexual, importunação sexual, perseguição, posse sexual mediante fraude e vias de fato.
As mulheres foram ouvidas pela delegada Maíra Pacheco, da Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher), e pelo delegado Wilton Vilas Boas, na Corregedoria-Geral da Polícia Civil, no último dia 7.
Apesar de o assunto ter sido tratado até em reunião pública na Governadoria, a delegada explicou ao Jornal Midiamax que não pode dar declarações sobre o caso, já que a investigação está sob sigilo.
Maira Pacheco afirmou que Marquinhos Trad ainda não foi ouvido, pois é praxe neste tipo de inquérito ouvir o suspeito no final.
Cargo comissionado e declarações de amor
A primeira mulher a procurar a delegacia relatou que se envolveu emocionalmente com o ex-prefeito e que ele dizia a ela que a amava e queria ficar com ela. Ainda teria dito que queria ter um filho com a vítima.
Tudo teria começado em 2020, quando ela conheceu outra mulher que lhe ofereceu uma oportunidade de trabalho.
A vítima, que terá a identidade preservada, contou que ganharia um cargo comissionado em um orgão público municipal. Mas, para isso, tinha que conversar pessoalmente com Marquinhos Trad, então prefeito de Campo Grande.
Ainda segundo os relatos, ela pegou o contato do prefeito e marcou às 8 horas, no gabinete, no dia 12 de maio de 2020. Era o começo da pandemia mundial de covid-19 e, neste dia, 17 pessoas já haviam morrido da doença em Mato Grosso do Sul.
No Paço Municipal, no entanto, segundo a versão da mulher, o clima era de romance e o prefeito teria até feito truques de mágica para agradar a convidada. De acordo com ela, a conversa teria sido pessoal e quase não teriam falado de trabalho. Depois, o prefeito teria tentado beijar a vítima, que recusou.
De acordo com o depoimento, ela teria saído pelo plenarinho e passou a receber mensagens de Marquinhos Trad, dizendo que tinha saudades e queria vê-la novamente.
Foi então que a vítima passou a frequentar o gabinete. “Uma vez por semana na expectativa de ser contratada, mas só tratava de assuntos de cunho sexual”.
Ela então confirmou que se envolveu emocionalmente e garante que teria passado a manter relações sexuais com o prefeito, sempre com consentimento, no banheiro do gabinete da Prefeitura.
Sexo consentido é quando as duas partes aceitam participar.
Sexo sem camisinha e nomeação com salário de R$ 1,4 mil
A vítima relatou que pedia o uso de preservativo, mas que o então prefeito dizia para ela confiar, porque queria ter um filho com ela. Em agosto de 2020, conforme apurado pelo Midiamax, ela foi nomeada em cargo de auxiliar administrativo e financeiro, com salário de R$ 1,4 mil.
No entanto, não chegou a trabalhar nem receber pelo cargo, conforme contou à polícia.
Já em 2021, foi transferida para outro cargo e, mesmo assim, não trabalhava presencialmente, apenas assinava a folha de ponto. Ela contou no depoimento que as relações com o então prefeito diminuíram, quando ele passou a segui-la nas redes sociais, pedindo que apresentasse algumas amigas.
Em determinado momento, Marquinhos Trad teria pedido que a vítima fosse ao gabinete, onde ela foi apresentada a um homem, um empresário. Naquele dia, ela conta que se sentiu humilhada e constrangida, pois teria sido “vendida” e tanto o então prefeito quanto o empresário só falavam sobre o corpo dela.
Em junho deste ano, ela ainda contou que esteve com Marquinhos no comitê, para pedir um emprego fixo, quando ele teria tentado beijá-la a força, mas ela se negou. Assim, aceitou outra proposta de emprego e passou a receber ligações de pessoas ligadas ao pré-candidato, questionando porque ela não queria mais trabalhar lá.
“Se sente humilhada e usada. Está com seu estado emocional e psicológico abalado e hoje percebe que sofreu assédio sexual”, consta no termo de depoimento. A vítima ainda relatou que se sente coagida pela influência do político e que tomou conhecimento por um funcionário da Prefeitura de Campo Grande que outras mulheres já passaram pela mesma situação.
Em um caso, uma das vítimas teria procurado a Deam, onde funcionários da prefeitura compareceram e entraram em um acordo financeiro com a mulher, que não prosseguiu com a denúncia.
'Festinha' no interior com mulheres, delegado e empreiteiros
A mesma mulher ainda relata que em 2021 recebeu uma mensagem, sendo convidada para ir ao Aeroporto Santa Maria, em Campo Grande, de onde seguiriam para uma fazenda no interior, participar de uma festa.
Ela e as outras vítimas envolvidas no processo voaram em uma aeronave particular até a propriedade rural.
Na festa citada pela vítima, estariam pessoas ligadas a Marquinhos Trad, como um delegado da Polícia Civil, que teria agredido a mulher com um tapa no rosto durante a 'festinha', dois empreiteiros e outros servidores públicos.
Ela contou que depois ele se desculpou e que não recebeu outras ameaças. A festa teria sido regada a drogas e bebidas alcoólicas e as mulheres chegaram a receber dinheiro ao voltarem para Campo Grande.
Apesar de citar que teria conhecido o empreiteiro que promoveu a festa através de Marquinhos, no depoimento a mulher diz que o então prefeito não participou da 'farra'.
'Sei que isso é pecado', teria dito a mulher em busca de emprego
Assim como a ex-amante, outra vítima foi ouvida no dia 7 de julho e contou à Polícia que teria sido apresentada a Marquinhos Trad por uma amiga, após dizer que precisava de emprego. Foi marcada uma reunião e ela também relatou que o então prefeito foi “amável, acolhedor, carinhoso com ela e sensível com a situação financeira”.
Novamente ele teria feito os truques de mágica com baralho. Naquela primeira reunião, a vítima teve relações sexuais com Marquinhos Trad, no banheiro do gabinete da prefeitura. Ainda conforme o depoimento dela, a relação foi consentida, mas ela queria que ele usasse preservativo, o que não foi feito.
A mulher ainda relata que teve relações quatro vezes com o então prefeito e que sempre era prometido emprego, mas que ele nunca cumpria.
Ele teria relatado a essa vítima que, depois que ela saía, ele ajoelhava e orava pedindo perdão a Deus, “porque sei que isso é pecado”. “Vou cuidar de você”, teria ouvido do então prefeito.
A vítima relatou à polícia que se sentiu usada emocionalmente, porque precisava de dinheiro na época.
A terceira mulher ouvida pela Polícia Civil era mais nova do que as amigas. Da mesma forma que as outras vítimas, ela precisava de um emprego e foi apresentada ao então prefeito de Campo Grande.
Eles tiveram uma conversa no gabinete e ela chegou a relatar que sabia que a amiga tinha uma relação íntima com Marquinhos Trad. Mais uma vez, os truques de mágica. A vítima contou que ficou nervosa com as investidas do suspeito e que ele teria a chamado ao banheiro do gabinete, onde tentou beijá-la.
O acusado teria tentado manter relação sexual com a vítima, que negou. Ele então se vestiu e ela afirmou que não contou para ninguém sobre o ocorrido, pois ficou com medo. “Quem é que mexe com ele”, disse para os delegados. Depois disso, não teve mais contato com o prefeito.
A última vítima ouvida na delegacia não quis dar declarações, ainda com medo. Ela disse que teve um encontro com Marquinhos e que foi apresentada a ele, sentindo que ele a abordava com finalidade sexual. “Já havia rumores que ele gostava de se aproximar de meninas jovens e bonitas que precisassem de ajuda”, consta no breve relato.
Já foi investigado também por assédio contra adolescente
Em 2018, investigação contra Marquinhos aconteceu na Depca (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente), após suposto assédio contra uma mirim, de 17 anos. O caso chegou anonimamente à polícia, que levou a jovem e a mãe para prestarem depoimento na delegacia,
Na época, foi relatado que a menina já trabalhava na prefeitura e foi solicitada a atuar no gabinete do prefeito, onde ficou por um mês. Em determinada ocasião, ele teria encontrado com a vítima na escadaria e pedido a ela um beijo no rosto. No entanto, se virou e deu na adolescente um ‘selinho’.
A vítima teria ficado amedrontada e passou a receber ligações do acusado. Ela chegou a dizer naquela época que ele mantinha relações com mulheres mais velhas no gabinete. Certo dia, o então prefeito estaria procurando a mirim, que ficou com medo e foi levada para casa por uma funcionária da prefeitura.
O então prefeito chegou a ir até a casa da vítima com um assessor, onde tentaram desqualificar a adolescente dizendo que ela estaria passando por problemas psicológicos. No outro dia, policiais civis foram até a casa da vítima depois de receberem denúncia anônima dos fatos.
O assessor chegou a ir até a delegacia e foi orientado por um investigador que não deveria estar ali. A mãe da adolescente não quis dar andamento no processo, porque “não queria ser incomodada ou procurada pelo prefeito ou pelos assessores”.
Marquinhos Trad nega todas as acusações e afirma que já tem advogados reunindo documentos e 'provas robustas' que comprovariam se tratar de uma armação.
Dândara Genelhú, Evelin Cáceres e Renata Portela/MidiamaxUol
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