Nomeado para o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul em dezembro de 2014 e afastado da função desde o último dia 24 de outubro, Osmar Domingues Jeronymo fez uma série de negócios com narcotraficantes e por isso a Polícia Federal suspeita que parte de seu patrimônio seja “aparentemente proveniente de tráfico de drogas”. Ele fez negócios até com o “braço-direito” de Fernandinho Beira Mar.
A informação consta na página 140 do relatório de 850 páginas da Polícia Federal que fundamentou não só o pedido de afastamento, mas também de prisão de Osmar Jeronymo. O pedido de prisão foi indeferido.
Com base neste mesmo documento, o ministro Francisco Falcão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), também determinou o afastamento de cinco desembargadores e de um juiz do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Além disso, determinou busca em endereços de dois desembargadores recém-aposentados.
Os detalhes sobre estas supostas negociações para “lavar” dinheiro do narcotráfico fazem parte de um relatório da PF de 2021, que resultaram na operação Mineração de Ouro, na qual foram afastados outros três conselheiros do Tribunal de Contas. Os três seguem afastados.
A operação Mineração de Ouro foi um desdobramento da Lama Asfáltica e promoveu uma devassa nas movimentações financeiras e de Osmar Jeronymo, encontrando uma série de negócios feitos com traficantes famosos.
Em 2019, segundo a PF, o conselheiro teve rendimento de R$ 3.847.472,76, como ele mesmo informou em sua declaração do Imposto de Renda. O valor levantou suspeita da Polícia Federal, pois deste total, R$ 1,674 milhão seria referente à venda de um imóvel em Campo Grande.
Esta casa teria sido vendida por R$ 2,3 milhões para Adriana Elizabeth e, apesar de ter declarado o recebimento de R$ 1,7 milhão adiantado da compradora, não há depósito ou pagamento oriundo de Adriana nas contas de Osmar. Além disso, não foi registrado contrato de venda em cartório.
Com essa movimentação suspeita, de acordo com a PF, o patrimônio do conselheiro do TCE/MS saltou de R$ 6,6 milhões para R$ 7,8 milhões em um ano.
O enriquecimento suspeito alertou as autoridades policiais, que analisaram as contas de Osmar nos anos anteriores, o que levou a um possível relacionamento com o megatraficante “Carlinhos Duro” (Carlos Alberto da Silva Duro), do Paraguai, apontado como “braço-direito” do traficante Fernandinho Beira-Mar.
No começo de 2019, Osmar comprou uma casa em Ponta Porã, de Ademar de Souza e Iracema Barreto de Souza, por R$ 500 mil. O casal, conforme a PF, é mencionado em ação penal que apura crimes de lavagem de dinheiro para traficantes da fronteira.
Cerca de cinco meses depois, Osmar trocou esta casa na fronteira por uma casa na Avenida Mato Grosso, em Campo Grande, pertencente ao traficante Carlinhos Duro. O imóvel da Capital foi avaliado em R$ 905.323,70.
Ou seja, “em um intervalo de 4 meses, Osmar Jeronymo conseguiu negociar o bem com uma valorização de 81,06%, valor R$ 400 mil superior ao de Ponta Porã, e Osmar teria pago a Carlinhos a diferença “à vista”, conforme consta nas investigações”, diz o relatório da PF de 2021.
Porém, para a PF, tudo aponta que as movimentações possam fazer parte de um esquema de lavagem de dinheiro do tráfico, pois não há registros de movimentações financeiras entre Osmar e o casal Ademar e Iracema pela compra do imóvel em Ponta Porã e Carlinhos e a esposa Cledi Duro não estão entre as movimentações financeiras do conselheiro do TCE/MS.
Com isso, segundo a PF, “conclui-se, a nosso ver, que há fortes suspeitas de ilicitude, como a lavagem de dinheiro, envolvendo Osmar Jeronymo”.
Ainda em 2019, o conselheiro recebeu R$ 1.892.182,70 de Luciano Verbena, em apenas 9 dias. Além disso, recebeu R$ 41.278,00 da Hexxa Shows Gestão Artística Eireli, em 21/01/2019.
Estas movimentações não foram mencionadas em suas transações imobiliárias ou em sua declaração de imposto de renda. Luciano e a empresa Hexxa também são citados como possíveis envolvidos com o tráfico internacional de drogas e lavagem de dinheiro.
Nas investigações, a PF ainda encontrou R$ 2,99 milhões em transações financeiras consideradas atípicas e suspeitas envolvendo o conselheiro em 2019..
Os investigadores dizem que parte desse valor foi pago por empresas que podem ter atuado apenas como de fachada. Parte das empresas que fizeram estas transferência fecharam dias depois de fazerem o pagamento.
Além disso, entre aqueles que fizeram os supostos pagamentos eram beneficiários do bolsa família e/ou posteriormente receberam auxílio emergencial.
“É importante mencionar que diversos esquemas criminosos destinados à ocultação de bens, direitos ou valores (lavagem de dinheiro) utilizam empresas recém-criadas, com sócios de baixa capacidade financeira, para movimentar vultosos recursos de dinheiro, por um breve período de tempo. Após cumprirem a sua finalidade, as pessoas jurídicas são baixadas”, diz trecho do relatório da PF.
Osmar Jeronymo poderia até alegar que não tinha conhecimento de que estava negociando com traficantes. Porém, eles são famosos e seria fácil fazer esta descoberta, alerta da PF.
“Em consulta ao Sistema Infoseg, “Carlinhos Duro”, está vinculado a diferentes registros da Polícia Federal e da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso do Sul. Além disso, diversas notícias jornalísticas informam que Carlos Alberto da Silva Duro já foi preso em investigações relacionadas ao tráfico internacional de entorpecentes e ao crime de lavagem de dinheiro, sendo apontado, em diversas reportagens, como o braço direito de “Fernandinho Beira-Mar”, diz o texto da PF.
A Polícia Federal solicitou explicações do conselheiro sobre as movimentação suspeitas e, conforme o relatório da Ultima Rátio, ele informou que "são recebimentos relativos a venda de imóvel e negociação de gado".
FAZENDAS
Na operação Ultima Ratio, desencadeada no dia 24 de outubro, a Polícia Federal aponta que Osmar Jeronymo comprou decisões judiciais para se apossar de partes de duas fazendas, em Bela Vista e em Maracaju.
Os imóveis estão no nome de dois sobrinhos dele, mas a suspeita da PF é de que sejam laranjas do conselheiro. Em um dos casos chegaram a falsificar assinaturas em cartório e a espancar um dos pretendentes que também tinha interesse em comprar o imóvel.
Neri Kaspary/ Correio do Estado
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