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19/11/2010 - 09:14
Distribuição dos serviços de saúde demarca dois Brasis
Opinião e Notícia
O Brasil registrou avanços notáveis na área de assistência médico-sanitária na última década. Mas não consegue superar a grave doença estrutural da desigualdade no acesso aos serviços de saúde. É o que mostra pesquisa divulgada nesta sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em todo o país, aumentou progressivamente, desde 1999, a proporção de médicos e equipamentos de saúde em relação à população. Mas os números mostram com clareza que profissionais e tecnologias fundamentais para o diagnóstico de doenças responsáveis por grande número de mortes continuam concentrados nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Norte e Nordeste permanecem na lanterna da lista de beneficiários dos recursos da saúde, tanto na disponibilidade de profissionais quanto na de equipamentos modernos.

O tamanho dessa desigualdade é particularmente impressionante na taxa de médicos por mil habitantes. Em 2009, na região Sudeste, havia 4,3 médicos por mil habitantes. No Sul, o índice chegou a 3,4 e no Centro-Oeste, a 3,1. No Nordeste e no Norte, a taxa é inferior à média brasileira, que ficou em três médicos por mil. A Organização Mundial de Saúde não estabelece um patamar desejável nesse indicador. Mas a comparação com outros países fala por si só. Estudo do Conselho Regional de Medicina de São Paulo, feito em março de 2010, mostra que a estatística atual de saúde reedita até a famosa Belíndia, termo criado pelo economista Edmar Bacha nos anos 1980 para ilustrar a imensa desigualdade brasileira – indicadores de Bélgica e de Índia no mesmo país. A cidade de São Paulo tem índice belga (4,3 médicos por mil habitantes) e o Maranhão, com apenas 1,3 médico por mil habitantes, está próximo da realidade indiana.

O IBGE aponta ainda como desequilíbrio estrutural importante a concentração de profissionais nas capitais, com grandes vazios no interior do Brasil. Em 2009, 23,7% da população viviam nas capitais, enquanto 40,2% dos médicos estavam lotados nessas cidades, o que equivale a uma relação de 5,6 profissionais por mil habitantes, contra uma proporção de 2,6 nos demais municípios.

Tecnologia para poucos - No que se refere ao acesso a equipamentos modernos, existe um abismo entre as regiões brasileiras, embora, de novo, registre-se um aumento geral considerável na oferta desses recursos. Na região Norte, o número de mamógrafos, essencial para a prevenção do câncer de mama, cresceu 7%, bem acima da média nacional. Mas a oferta do equipamento ainda equivale a apenas um terço da registrada na região Sudeste – 1,1 mamógrafo por cem mil habitantes no Norte, 3 mamógrafos por cem mil habitantes no Sudeste.

“Na média brasileira, a concentração desses equipamentos se assemelha a vários países com nível de desenvolvimento econômico maior do que o nosso país, como França, Inglaterra e Canadá. O que se conclui é que o Brasil compra os equipamentos em proporção bastante razoável. No entanto, o acesso aos serviços prestados por esses equipamentos à população é bastante desigual”, diz o gerente da pesquisa Marco Andreazzi.

No norte, só há 0,87 tomógrafos para cada cem mil pessoas. A taxa é quase a metade da média brasileira, de 1,6 tomógrafo. Ainda na mesma região, existem apenas 6,9 aparelhos de ultrassom para cada grupo de cem mil habitantes, enquanto o Sudeste esse índice é de 11,1 por cem mil.

Público x Privado- A pesquisa detectou também problemas na distribuição de equipamentos entre unidades de saúde públicas e privadas. Em visita no mês de agosto ao Rio de Janeiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já havia lembrado que alguns serviços só são oferecidos para quem tem plano de saúde. O levantamento do IBGE confirmou a fala do presidente. Na época, durante inauguração de um caminhão na Baixada Fluminense, onde foi instalada uma unidade móvel de ressonância magnética, ele disse: “Ressonância magnética é uma coisa chique. O secretário (Sérgio Côrtes) e o ministro da Saúde podem, mas não é qualquer pobre que pode fazer. Eu e eles podemos fazer ele porque temos plano de saúde. Quem tem plano bom pode”.

O caso da ressonância magnética é o mais expressivo. Houve um aumento de 118,4% na quantidade desse aparelho na comparação com a mesma pesquisa feita em 2005. A média brasileira é de 6,3 equipamentos de ressonância por um milhão de habitantes. Esse número no Sistema Único de Saúde (SUS) é de 1,9, no setor público é de 0,4, no setor privado de 5,9 e nos estabelecimentos privados que atendem ao SUS é de 2,3 por milhão de pessoas. Destaca-se o fato de que, para quem tem plano de saúde, há 19,8 aparelhos de ressonância para cada um milhão de habitantes.

O serviço de quimioterapia, por exemplo, é oferecido em apenas 3,8% dos estabelecimentos públicos com internação. Já nos privados, o percentual é de 10,5%. A diferença é vista em outros serviços, como a quantidade de estabelecimentos com internação que possuem Centro (ou Unidade) de Terapia Intensiva. Nas unidades particulares, esse número chega a 32%, nas públicas, 16,8%. “São dois Brasis”, resume Andreazzi.



    
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