Professora Amanda Gurgel Amanda Gurgel vê crise de identidade nos professores
Com um depoimento-desabafo emocionado e direto, a professora Amanda Gurgel de Freitas, 29 anos, solteira, 1,60 m de altura, cabelos encaracolados, “bombou” no You Tube esta semana com um vídeo de nove minutos falando da situação da educação no Rio Grande do Norte, que pode ser estendida ao resto do país. Mostrando um contracheque de R$ 930,00 do salário base do professor no seu Estado, Amanda calou os deputados estaduais durante audiência pública na Assembléia Legislativa, no dia 10 de maio.
Para a professora-celebridade, nascida em Natal, hoje o professor sofre de crise de identidade e também está doente. Militante do PSTU, Amanda no momento é professora do Estado e do município de Natal. No Estado o seu salário básico é de R$ 930,00 e no Município chega a R$ 1.217,00. Ela tem especialização em Educação para Adultos, mas não está em sala de aula.
Amanda pediu adaptação de função depois de uma depressão e agora trabalha na biblioteca do colégio Estadual Miriam Coeli e no setor de informática da escola municipal Professor Amadeu Araujo, ambas no bairro de Nova Natal, zona Norte.
Abaixo, a entrevista com a nova celebridade da cidade, que nesta quinta-feira, 18, deu várias entrevistas para jornais e TVs da capital. A entrevista a seguir foi dada com exclusividade para O Globo, na quarta-feira, no colégio Winston Churchill, depois da assembléia dos professores que manteve a greve da rede estadual de ensino.
Amanda - Nunca, eu jamais imaginei que uma situação que para mim é tão corriqueira e tão obvia para todo mundo, não tem que não veja a rotina de um professor como é. Eu jamais imaginei que esta rotina, por uma discrição simples, ela pudesse ter uma abrangência tão grande, de tão obvia que é.
O que você acha que está faltando dos governos para que a situação do professor mude?
Amanda – Posso falar sinceramente: vergonha. Principalmente isso, mas na verdade a gente sabe que, por trás dessas de todas essas políticas que são implementadas, existe uma orientação ideológica, que é a orientação do capitalismo. É uma ideologia que divide a sociedade em classes e que oprimia os trabalhadores, todos eles, em todas as categorias, inclusive a nossa. A intenção dos políticos é essa. Esse caos que existe na educação não é um caos desorganizado, entre aspas, é um caos preparado, existe uma intenção para que a educação funcione desse jeito para que os filhos da classe trabalhadora jamais atinjam altos níveis de cultura, para que no máximo eles aprendam um oficio.
Você hoje tem dois trabalhos, acorda às 5 horas da manha e passa o dia todo trabalhando. Como é uma vida de um professor sem condições até de se qualificar, de ler. Como você faz para se atualizar?
Amanda – Olha, é muito difícil. Para qualquer professor, isso é muito difícil. Então, a nossa categoria nesse momento, até é importante tocar nesse ponto, nós vivemos uma certa crise de identidade, porque enquanto a nossa atividade sempre foi considerada intelectual, e ainda hoje leva esse nome de uma atividade intelectual, de formadores de opinião, a verdade é que nós estamos passando por um processo de proletarização, que está se acentuando a cada dia. , e nós hoje, a nossa atividade é principalmente manter o aluno em sala de aula, independente de qualquer coisa. Por isso que muitas vezes as pessoas confundem os responsáveis pelo caos e acha que a greve atrapalha os alunos. Na verdade, a greve não atrapalha, justamente por isso, se nós não estivéssemos em greve não teria a oportunidade de falar sobre a educação nesse momento, porque estariam todos os alunos dentro da sala de aula controlados pelo professor, que não estaria em condições de ter uma atividade digna de exercer a sua atividade docente decentemente porque as salas são super lotadas, porque as salas são quentes aqui na nossa cidade, que é uma cidade de clima tropical, também por isso, o porque o professor não tem condições de se atualizar. Infelizmente, não é dada essa oportunidade para o professor.
Qual seria salário justo que você pudesse trabalhar feliz como professor e pudesse trabalhar só em um colégio?
Amanda – Olha, dizer assim um salário com o qual eu trabalharia feliz é complicado. Eu procuro na minha vida e principalmente na minha militância, na minha atividade diária, me apoiar em dados. A nossa organização ela defende para a classe trabalhadora, inclusive para a nossa categoria, um salário mínimo calculado pelo Diese, que é um de dois mil e cento e poucos reais para uma jornada de 20 horas semanais. Para iniciar, isso seria digno, não se seria suficiente, mas pelo menos digno.
Você comentou que o professor sofre muito de doenças psicossomáticas, inclusive amigas e mesmo você já teve uma depressão. Como é essa situação dos professores em termos de saúde?
Amanda - Os professores são submetidos a uma jornada de trabalho que é extenuante, sem ter condições de trabalho dignas. Frequentemente desenvolvem doenças relacionadas à sua atividade, e em troca, recebem por parte dos governos mais uma forma de opressão, que é impedi-los de dar entradas em licenças médicas ou em readaptação de função. Recentemente, em um consultório, um médico disse que não poderia fornecer um laudo para encaminhar um paciente a uma junta médica porque hoje em dia professor e policial são tudo assim, querem ganhar dinheiro sem trabalhar. Dentro do consultório médico ele defendeu a política do governo, dizendo que o governo está muito certo mesmo, independente do seu estado de saúde, o professor tem mais é que estar em sala de aula. Isso só reforça essa idéia de que para o governo educação de qualidade é aluno controlado dentro de sala de aula, independente da condição dessa aula e das condições de saúde do trabalhador.
Qual a participação do governo do Estado nessa opressão aos professores?
Amanda – Ele não tem uma participação. Ele tem total responsabilidade. A governadora Rosalba Ciarline, juntamente com a secretária de Educação, Betânia Ramalho, utiliza o mesmo discurso usado por todos os governos que assumem o cargo em cada gestão, que é de justificar a sua política de opressão nos erros da gestão anterior. Quando na verdade, nenhum dos governos têm intenção de mudar. Essa é uma política do governo Rosalba amparada pelo governo Dilma, e sem perspectiva de melhoras. Pelo PNE (Plano Nacional de Educação) que está sendo apresentado pelo governo, não existe perspectiva de mudança, porque não existe perspectiva de maiores investimentos na educação, certo.
Depois desse sucesso todo, você pretende se candidatar a algum cargo político?
Amanda – Nunca pensei sobre isso, não pretendo no momento. Talvez as pessoas possam achar que eu fiz isso por interesse. Mas minha militância é pelas demandas da nossa categoria e não gostaria que fossem confundidas com as do partido. Não tenho pretensão política governamental, mas faço política no meu dia-a-dia. As pessoas que me conhecem sabem de minha atuação. Talvez em outros momentos a conjuntura possa me levar para outros rumos.
Cresce adesão dos professores a greve após o sucesso do vídeo de Amanda no You Tube
Com o vídeo da professora Amanda repercuntindo em todo o Brasil, a adesão à greve dos professores no Rio Grande do Norte cresceu em todo o Estado. De 29% de adesão antes do vídeo, nesta quinta-feira, dia 19, o percentual de educadores parados pulou para 45% nas 718 escolas estaduais espalhadas pelos 167 municipios do Estado.
Os professores do Estado estão em greve geral desde o início de maio e reivindicam piso salarial de R$ 1.530,00 para nível médio e R$ 2.142,00 para nível superior. O governo do Estado até reconhece como justas as reivindicações da educação, mas alega que não tem dinheiro e um aumento à categoria oneraria a folha de pagamento, contrariando a Lei de Responsabilidade Fiscal que limita os gastos com pessoal.
A governadora Rosalba Ciarline solicitou paciência para professores e policiais, já em greve, e para os médicos, que anunciaram paralisação para junho. Segundo ela, o primeiro quatros meses do seu governo foi encerrado com o Estado acima do limite prudencial da lei.
- Minha vontade é atender a todas as reivindicações, mas não podemos fazer milagre – afirmou Ciarline, admitindo que a situação financeira do Estado não é boa.
- O Estado não está como alguns acham, não está com essa saúde. Estamos lutando para superar. Esse ano será o ano de maior dificuldade, não tenho dúvida- disse a governadora
O sindicato dos Trabalhadores em Educação do Rio Grande do Norte (Sinte-RN) informa que dos 18 mil professores da rede estadual, cerca de 93% estão parados.
A secretaria Estadual de Educação informa que este percentual é menor, mas admitiu o crescimento depois do vídeo no You Tube. O movimento começou com 9% dos professores parados, depois subiu para 18%.
Com postagem do vídeo, no dia 14, o percentual de grevistas aumentou para 29%. A repercussão do vídeo nas redes sociais da internet elevou o número de grevistas para 45% nesta quinta-feira. Veja o Vídeo
http://terratv.terra.com.br/videos/Especiais/Hits-da-Web/4412-364808/Desabafo-de-professora-cala-deputados-do-RN-veja.htm- |