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Polícia |
17/11/2011 - 22:25 |
Nem, o traficante do duplo sentido |
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Opinião e Notícia |
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Desculpe o trocadilho mas “nem” seria preciso explicar quem é Antonio Francisco Bonfim Lopes. O traficante está nas manchetes de todos os jornais e é campeão de audiência nas emissoras de TV na semana em que o Brasil comemora a proclamação da República. Ele foi o sucessor e herdeiro de uma estrutura de poder paralelo que durante 40 anos levou medo a um conglomerado de favelas encravadas num mesmo maciço: uma na encosta (Vidigal), outra no topo (Chácara do Céu) e a terceira num vale (Rocinha), todas com vista privilegiada para o mar — formando uma república com mais de 100 mil habitantes. Nem foi o último mandatário. Mandava matar inimigos, mandava expulsar moradores e mandava pagar propina a policiais.
Repare que as frases que começam com o apelido do traficante tornam-se confusas e ganham duplo sentido. Negam todas as afirmativas. Como um verdadeiro chefe de Estado, Nem concedia entrevistas à grande imprensa e bajulava gente poderosa, como o ex-presidente Lula — de quem se dizia um fã — e também o competente secretário de Segurança Pública, José Mariano Benincá Beltrame. Leitor da Bíblia, Nem se dizia um pai zeloso com a educação dos filhos e contrário à venda de crack no território que dominava por ser esta uma droga de alto poder de destruição. Mas não se deixe enganar: ele não estava “nem” aí.
O bandido comandava um selvagem esquema de produção e venda de cocaína e maconha que gerava um faturamento anual de R$ 100 milhões. Mas é dura a vida de um facínora. Metade do que ganhava ia direto para policiais militares, do 23º Batalhão, e civis, da delegacia da Gávea. Alguns podem chamar de propina, o traficante usava o termo “arrego”, mas não se engane: é mesmo desavergonhada corrupção policial.
Com a metade da bufunfa que lhe sobrava, ele pagava uma alta conta de assistencialismo — como convém a um governo de republiqueta de meia-tigela: comprava remédios, cestas básicas, pagava enterros, financiava obras — com a compra de tijolos e cimento, por exemplo — para a construção de casas na comunidade.
Nem pode parecer tolo ao denunciar o lado podre da polícia. “Qualquer dia desses ele aparece morto”, pensariam alguns. Na verdade, ele foi esperto. Nem fez isso para continuar vivo. E, a partir desta denúncia, o Estado precisa mantê-lo assim. Retirado de um humilhante esconderijo no interior do porta-malas de um carro, Nem perdeu o topete — o duplo sentido também cabe aqui — tornando-se um preso comum e de cabeça raspada. Depois que entregar uma lista mínima de policiais — que satisfaça à curiosidade do secretário Beltrame, do governador Cabral e da sociedade — Nem deverá ser transferido para um presídio federal e de segurança máxima.
Cabe ao secretário, ao governador e à sociedade decifrar esse conto de fadas de que Nem embarcou na mala do carro para se entregar numa delegacia. Tem policial jurando de pés juntos que isso é verdade. Difícil é sustentar tal versão quando se sabe que, no mesmo porta-malas, havia R$ 180 mil — quantia suficiente para dar a volta ao mundo. A delegada que tem nome de miss — a chefe de Polícia Civil Marta Rocha — precisa subir a passarela e explicar porque seus agentes tencionavam exclusividade na prisão do homem mais procurado do país enquanto a Polícia Federal retomava importante reduto do tráfico em operação conjunta.
E quem estiver na lista de “arrego” de Nem, que se explique.
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