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Geral |
23/03/2012 - 14:55 |
Morre Chico Anysio |
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Foto: Divulgação |
Estadão |
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Morreu na tarde desta sexta-feira, 23, o humorista Chico Anysio. Internado no Hospital Samaritano do Rio de Janeiro desde o dia 22 de dezembro de 2011, o humorista teve sua morte confirmada às 14h52 em decorrência de falência múltipla de órgãos, pela assessoria do hospital. Aparentemente abalada, a assessora de imprensa do humorista, Luciana Sander, também confirma a perda.
Chico Anysio que havia sido diagnosticado com pneumonia, apresentava também complicações renais e, de acordo com o último boletim médico ele passou por hemodiálise e respirava com ajuda de aparelhos.
Cearense nascido em Maranguape, em 12 de abril de 1931, Francisco Anysio de Oliveira Paula assumiu a identidade de dezenas de personagens - só para citar alguns, Professor Raimundo, Bozó, Painho, Coalhada, Alberto Roberto, Justus Veríssimo, Salomé, Bento Carneiro, Pantaleão, Nazareno, Haroldo e Azambuja -, mas foi sobretudo como Chico Anysio que fez fama.
Fazia mais de ano que Chico exibia saúde frágil, sem contudo se render ao sedentarismo. Morando em São Paulo, com sua sexta mulher, a gaúcha Malga di Paula, de 40 anos, frequentava a ponte aérea desde o início de 2010, graças à decisão da Globo de finalmente reabrir a tampa do caixão de Bento Carneiro, o Vampiro Brasileiro. Depois da primeira internação de lá para cá, trocou o Vampiro pela gaúcha Salomé pela comodidade da cena, sempre estática, ao lado do telefone.
Eram participações no Zorra Total, nada perto de ter um programa só seu, como acontecia desde os primórdios da TV, até o ano 2000, quando foi confinado à geladeira da Globo. Até lhe dar uma vaga no calendário de especiais de fim de ano, em dezembro de 2009, a direção da emissora contou 9 anos privando o telespectador de suas piadas. O freezer foi resultado de algumas entrevistas dadas por Chico na época (leia na página ao lado). Foram declarações que lhe renderam longo exílio do vídeo, embora a Globo tentasse camuflar o castigo, aqui e ali, com participações esporádicas do humorista em minisséries e novelas. A última foi Caminho das Índias, também em 2009, como pai de Radesh (Marcius Melhem).
Ainda em 2009, Chico dublou o adorável ranzinza Karl, protagonista da animação vencedora do Oscar Up - Altas Aventuras. Também podia ser apresentado como compositor, escritor ou pintor, tendo protagonizado várias exposições de seus quadros. Nas suas contas, criou 209 personagens, alguns para outros atores - caso do inesquecível Primo Rico, com Paulo Gracindo, em dueto com Brandão Filho.
A carreira começou na Rádio Guanabara, no Rio, para onde a família Anysio de Paula se mudou quando Chico tinha 8 anos. Tornou-se vascaíno, só para contrariar, porque o pai era botafoguense e eles moravam perto do Fluminense, o clube onde fez amigos, cresceu e jogou bola à vontade. Jogou até o dia em que, esperado para uma partida, foi em casa buscar o tênis e deu de cara com a irmã Lupi, que naquele instante saía com um amigo para ir fazer um teste na Rádio Guanabara. “Vou junto”, disse Chico. Aprovado para radioator e locutor, dizia sempre que tinha virado ator porque esquecera o tênis.
Mas a percepção de que poderia se dar bem no rádio já existia. Àquela altura, Chico já havia vencido vários concursos de calouros graças ao talento de imitar vozes famosas, entre locutores e artistas. Fazia Oscarito, Saint Claire Lopes, Rodolfo Mayer, James Manson, James Cagney e Luiz Jatobá. Passou ainda pela Rádio Mayrink Veiga.
“Ele sempre foi calado, na dele, nunca foi de exibições. Geralmente, todo comediante é meio contido, né?”, afirmou, em abril (por conta dos 80 anos de Anysio) o também humorista Lúcio Mauro, amigo desde os tempos da Rádio Clube de Pernambuco, antes da vinda para o Rio, e companheiro de cena no antológico quadro do personagem Alberto Roberto - “Sou, mas quem não é”, dizia o bordão.
Na era da chanchada no cinema nacional, nos anos 50, chegou a escrever e a atuar em filmes da Atlântida. Estreou na TV em 1957 pela TV Rio, com o Noite de Gala. Em 59, estreou no programa Só Tem Tantã, mais tarde batizado como Chico Total. Pisou na Globo em 1968 e lá ficou.
Carlos Manga, amigo e seu diretor nos primórdios da TV, nunca quis ouvir falar em exagero. “O Boni sempre disse que ele seria um fenômeno se tivesse nascido nos Estados Unidos. Pois eu digo: se Chico Anysio tivesse nascido na Inglaterra, ele seria o Chaplin!”, comparou, em entrevista ao Estado, em abril passado. Foi Manga quem teve a ideia de aproveitar o recém-chegado videotape para fazer Chico se desdobrar em personas. “Eu vi aquela máquina no corredor da TV Rio e quando me contaram do que se tratava, pensei logo no Chico. ‘E se eu te disser que posso botar você para contracenar com você mesmo?’, perguntei a ele”, contou Manga. Nascia ali, em 1960, o Chico Anysio Show.
Livro. Casado por seis vezes, e isso não era piada, lançou o livro Como Salvar seu Casamento, que ensinava ao leitor dicas sobre uma boa relação. Mais 20 livros fecham a coleção de títulos lançados por ele no mercado editorial, entre biografias e anedotas.
Deixou 10 netos e 9 filhos: o ator Lug de Paula (da atriz e comediante Nancy Wanderley), o também ator e comediante Nizo Neto e o diretor de imagem Rico Rondelli (da atriz e vedete Rose Rondelli), André Lucas, adotado, o DJ Cícero Chaves (da ex-frenética Regina Chaves), o ator, escritor e comediante Bruno Mazzeo (da ex-modelo e atriz Alcione Mazzeo), além dos caçulas Rodrigo e Vitória (da ex-ministra Zélia Cardoso de Mello). Irmão da atriz Lupe Gigliotti e do cineasta Zelito Viana, era tio da diretora Cininha de Paula do ator Marcos Palmeira.
Em agosto de 2010, o humorista participaria dos Encontros Estadão & Cultura, sobre os 60 anos de TV no Brasil, mas estaria no Rio e concordou em enviar antecipadamente uma pergunta para a discussão do dia: “Todas as TVs se fizeram grandes através do humor, mesmo hoje os seus maiores índices são conseguidos com programas de humor. Por que não são feitos mais programas de humor, quando temos um time de mais de 50 excelentes comediantes?”. O assunto entrou em debate, sem que chegássemos a uma resposta.
Há dois anos, eram os novos comediantes que dirigiam uma pergunta a Chico: Por que ele estava fora do ar? Era a campanha “Volta, Chico”, encabeçada por Vesgo e Ceará, do Pânico na TV, pela RedeTV! “Talvez a Rede Globo esteja achando que eu já tenha feito por ela o suficiente e que eu deva ter um pouco de descanso. Eu não estou querendo esse descanso”, disse Chico, ao ser abordado por Vesgo e Ceará. A cena está no YouTube.
Em dezembro de 2009, quando a direção da Globo se rendeu ao mestre e lhe abriu uma vaga entre os especiais de fim de ano, viu-se, por cerca de uma hora, personagens das mais diversas etnias, estirpes e épocas a contracenar, todos na pele de Chico. Graças a recursos que Pantaleão não conheceu em seu tempo, Chico dialogou consigo mesmo em todas os quadros, reunindo mais de uma dezena de tipos na sala do professor Raimundo.
Na ocasião, ao vestir o figurino da gaúcha Salomé, figura íntima de João Batista (o Figueiredo, bem entendido, último presidente do regime militar no Brasil), telefonou para Luiz Inácio, ainda presidente da República, e ouviu uma voz feminina do outro lado da linha: “Dilma?”, perguntou, antevendo a eleição da atual presidente.
Jejum forçado. O especial fez eco e foi aí que a Globo resolveu resgatar Chico para o Zorra Total. Era o fim do jejum promovido pela Globo, ação endossada pela emissora em comunicado oficial, em2000, logo após uma entrevista do humorista à revista Isto É, com críticas ao novo modelo de gestão da emissora, a diretores e colegas. “Pela primeira vez, em 47 anos de TV, trabalho numa casa onde ninguém tem acesso à pessoa que nos dirige”, disse, sobre a então diretora-geral Marluce Dias da Silva, que substituíra José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni.
A Globo reagiu em nota: “Chico Anysio sistematicamente usa a imprensa para desrespeitar os telespectadores ao se manifestar de forma desabonadora com relação à empresa e seus colegas. (...) O artista vem se comportando de modo incompatível com os padrões éticos e de qualidade da emissora, o que exige a suspensão de sua participação na grade de programação. A TV Globo estuda outras medidas a serem tomadas em função desses acontecimentos.”
No dia seguinte, Chico rebateu, também em nota: “Sou um artista que, em 53 anos de profissão, sempre expressei livremente meu pensamento sem intenção de desrespeitar ninguém, muito menos a Rede Globo, onde trabalho há mais de três décadas, tendo excelente e respeitoso relacionamento, principalmente com a alta cúpula, a quem sempre rendi homenagens como o melhor empregador que já tive. Como artista, meu único patrimônio é meu direito de pensar e dizer, já que, por ser um criador, isto é uma qualidade inata. A este patrimônio não renuncio, mesmo em tempo de censura, como agora. (...) Estou tentando compreender os motivos que levaram a Rede Globo a agir desta forma que muito mais pune a ela do que a mim.”
A Globo o manteve sob contrato, evitando sua ida para outros canais. Para cerrar cortinas e encerrar qualquer discussão sobre as vertentes de humor e seus estilos, vale a frase do mestre: “Para mim, há dois tipos de humor: o engraçado e o sem graça. E eu fico com o primeiro”.
(COM INFORMAÇÕES DA CENTRAL DE NOTÍCIAS)
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